No segundo Open House da Purple Metrics, Caio Silva mostrou como transformar dados em ferramenta estratégica – e como evitar armadilhas comuns em marketing orientado por números.
Bruno Capelas – Purple Metrics

Transformar uma área de marketing com uma cultura de dados não é uma tarefa fácil.
Agora, imagine fazer isso numa empresa onde os dados não são apenas parte do processo, mas o próprio negócio. Foi justamente esse o desafio (e também a oportunidade, diriam os mais otimistas) que Caio Silva abraçou ao assumir a liderança de Marketing Analytics, CRM e MarTech na Serasa Experian, uma das maiores datatechs do país.
Com mais de dez anos de experiência em empresas como Itaú, Gol e Casas Bahia, Caio trouxe ao Open House – nosso evento de comunidade do Purple Metrics – uma visão rara: a de quem viveu o marketing antes e depois da transformação digital, e hoje enxerga os dados como muito mais que números em relatórios. “Dado é cultura”, resume ele. E essa cultura, segundo Caio, é o que muda o jogo de verdade.
O desafio de fazer marketing com (muitos) dados
Na Serasa, os dados são o ponto de partida, o meio e o fim de praticamente tudo. Mas lidar com eles está longe de ser simples. Muito pelo contrário. “Trabalhar com dados em uma data tech é diferente. Você tem uma responsabilidade muito maior – com o cliente, com a empresa, com o negócio”, contou o Caio. A começar pela própria mudança de posicionamento da Serasa, que deixou de ser apenas uma empresa de cobrança para virar uma plataforma de soluções financeiras.
A transformação também aconteceu no marketing, que teve de deixar de ser apenas um centro de campanhas para se tornar um hub estratégico baseado em dados. Nesse processo, um dos primeiros aprendizados de Caio foi perceber que a tecnologia, por si só, não resolve tudo. “Já trabalhei com times super técnicos, mas se não há cultura de dados, não adianta. O que muda o jogo é o time ter autonomia para consumir, interpretar e decidir com base em dados.”
Na visão dele, estamos vivendo uma segunda onda da “engenheirização do marketing”. A primeira, vale lembrar, aconteceu há mais de uma década, quando profissionais de Exatas começaram a entrar no marketing digital. Agora, o movimento tem um vetor contrário: em vez de buscar habilidades fora da área, os próprios profissionais de marketing estão adotando competências técnicas e de dados.
“Hoje, até analistas de criação querem saber o CTR dos vídeos, o engajamento dos criativos e a performance dos anúncios. Isso era impensável alguns anos atrás”, diz ele. Para Caio, essa transformação é fundamental para que o marketing tenha mais autonomia e tome decisões mais inteligentes. “A especialidade está entrando dentro do marketing, não o contrário.”
Medir não é só atribuir – é entender o contexto
Se você já se frustrou tentando provar que uma campanha deu certo mesmo quando o dashboard não mostrava nada, você não está sozinho. No Open House, Caio contou que vive esse drama diariamente. Um exemplo emblemático? O canal de SMS da Serasa.
“É um canal essencial para a gente, mas cheio de limitações técnicas e sujeito a fraudes. No modelo tradicional de last-click, ele parecia irrelevante. Mas quando desligamos o canal, o negócio sentiu na hora”, relembra. A solução para entender o impacto não foi desligar, mas sim criar um modelo próprio de atribuição focado no SMS, desenvolvido pelo time de marketing em parceria com dados e finanças.
O aprendizado aqui é claro: não existe um modelo de atribuição perfeito para todos os canais. “Cada canal tem uma vocação. É preciso medir o canal pela vocação dele – e não por uma régua genérica”, explica Caio. No caso do SMS, o modelo interno mostrou impacto direto e ajudou até a renegociar contratos com fornecedores.
Como errar em público
Um dos momentos mais interessantes do papo foi quando Caio falou sobre a cultura do erro em marketing – algo fácil de falar, mas difícil de fazer, segundo ele. “Marketing é a área que mais erra em público. Quando algo dá errado, todo mundo vê”, afirmou. Por isso, construir uma cultura de testes exige coragem – e alinhamento com outras áreas.
Para fazer isso funcionar na Serasa, Caio tratou de trazer o time de finanças para perto do marketing. “Quando a gente envolveu a área financeira nos modelos de ROAS (retorno sobre gasto com anúncios, em português claro) e atribuição, ficou mais fácil justificar os testes. Eles passaram a entender as métricas e a participar das decisões”, contou. Hoje, o ROAS interno da Serasa é construído em conjunto entre marketing e finanças, com cálculos compartilhados e decisões baseadas em um indicador comum. “Isso dá segurança para errar com responsabilidade. E, mais importante, errar junto.”
Outro erro que fez a Serasa aprender bastante foi investir em TV – e aqui, o aprendizado é saber encontrar o público, sem se deixar levar por métricas de vaidade. “Investir em TV era quase um selo de sucesso. ‘Ah, agora temos verba, vamos fazer TV’”, brinca Caio. Mas os primeiros resultados decepcionaram. Horário nobre? Péssimo. Patrocínio de programas? Fraco.
O que funcionou mesmo para a Serasa foi acordar cedo e anunciar na TV matinal. “A maior audiência que já tivemos foi com a Ana Maria Braga no Feirão Serasa. Foram tantos acessos que derrubaram o site”, contou. A lição aqui é que nada importa mais que o contexto. “Quando você fala de dívidas no Jornal Nacional, a mensagem pesa. De manhã, o tom é mais leve. As pessoas estão mais abertas”, disse. Hoje, a Serasa não só mede melhor o impacto de campanhas em TV, como também ajusta criativos, horários e formatos com base em dados reais – e não em suposições.
Deixar de investir também é um teste
Além de aprender a errar, outra estratégia que Caio compartilhou pode parecer contraintuitiva à primeira vista, mas é muito importante: pausar campanhas para entender seu real impacto. Em um caso prático (embora acidental), a Serasa acabou reduzindo as campanhas de Meta em algumas regiões. O resultado foi surpreendente: nenhuma diferença nas vendas.
“A campanha performava bem no dashboard, mas não movia o ponteiro. Provavelmente, ela estava capturando clientes que já iam converter de qualquer forma”, disse. Isso reforça a importância de medir o que realmente é incremental – e não apenas o que aparece nos relatórios. Hoje, o time de analytics da Serasa é responsável justamente por isso: entender o que está funcionando de verdade, e quanto está funcionando. “Individualmente, todo mundo tem números. Mas quem mostra o todo é o time de analytics.”
Sobre inteligência artificial, Caio é pragmático. Na Serasa, a IA já é usada intensivamente para geração de conteúdo de SEO – com revisão humana, claro. “A gente produz mais de 200 conteúdos por mês. IA ajuda muito. Mas tudo passa por jornalistas”, explicou.
Ao mesmo tempo, a empresa reverteu o uso de IA em um de seus produtos B2B que utiliza dados por não conseguir explicar os resultados para os clientes. “Regredimos para modelos estatísticos clássicos porque precisamos ter explicabilidade. O cliente quer saber por que recebeu aquele número”, disse o executivo. É uma dualidade que mostra o quanto a IA pode ser aliada – mas só se usada com critério e responsabilidade.
O tripé que sustenta a estratégia
A essa altura do campeonato, parece estar claro para qualquer executivo de marketing que não existe receita pronta nem fórmula mágica. Ainda assim, existem alguns passos importantes para quem quiser implementar uma boa cultura de dados. Para Caio, são três os pilares:
- Cultura, para que todos saibam usar os dados da forma certa.
- Autonomia, para que o time possa decidir e testar sem depender de outras áreas.
- Confiança, para que as outras áreas (como finanças e produto) respeitem e colaborem com o marketing.
“Hoje, a gente tem autonomia para alocar verba, testar novos canais e medir impacto com profundidade. Mas isso só foi possível porque mostramos resultado e construímos confiança”, diz. Que continue assim!
Pout-pourri: outros aprendizados com Caio Silva, da Serasa Experian
Ao longo do papo, o Caio dividiu opiniões e reflexões sobre outros temas bacanas. Aqui, trazemos algumas pílulas de ideias legais que ele discutiu com a gente.
“O marketing não é só um centro de execução — é um centro de decisões.”
Por trás dessa fala está uma provocação importante: quantos times de marketing ainda estão operando como “tiradores de pedidos”? Para Caio, o marketing só consegue ser relevante quando é tratado como uma área estratégica, com autonomia e ownership sobre o orçamento, as métricas e os resultados. É uma mudança de papel, saindo da ponta do funil e assumindo o volante do negócio. Isso exige não apenas competência técnica, mas postura de liderança.
“A especialidade deve morar onde o problema existe.”
Quando Caio contou que engenheiros de dados da Serasa respondem ao time de marketing — e não à TI —, ele não estava falando só de organograma, mas de filosofia. A ideia é simples, mas poderosa: se o problema é de marketing, a solução deve nascer dentro do marketing. Essa estrutura evita ruídos, acelera decisões e garante que o time técnico entenda as nuances do negócio. É um modelo que pode ser aplicado a outros times também: colocar o especialista onde está a dor.
“Todo time tem número. Mas nem todo número serve como resposta.”
Um alerta sutil, mas essencial: métricas isoladas podem iludir. O time de performance tem seus KPIs, o time de conteúdo também, assim como mídia, produto, CRM. Mas quem conecta todos esses números e responde à pergunta “o que realmente está funcionando?” é o time de analytics. O aprendizado aqui é estrutural: é preciso criar um papel institucionalizado que esteja acima dos silos — alguém (ou uma área) com autoridade para fazer leituras integradas e provocar as discussões difíceis sobre impacto real.
Hoje, a Serasa é cliente do Purple Metrics, e incluiu o modelo preditivo dentro do seu stack de métricas. Se você também quer saber como sua marca também pode testar e mensurar o que antes parecia intangível, dá uma olhada no nosso site.